quinta-feira, maio 10, 2007

Algumas respostas

Bom, são muitas as questões abertas pelo post de Paulinha. Vou tentar respondê-las, pois to com pressa. Se alguma delas ficar sem respostas, bom, depois completo.

Pois bem. Acho que a questão fundamental você mesma levanta, Paulinha: gravidez não é doença. Não é, mas pode ser encarada como uma, evidentemente. Mas o ponto é outro: o aborto não é a solução.

Se eu condenaria uma pessoa que mata outra por legítima defesa? Claro que não. Aí não há escolha, é uma questão da vida de um ou a vida de outro. Não é o caso de aborto. Prosseguir a gravidez não leva a uma fatalidade necessariamente. As pessoas que não desejam ter filhos para não perder a sua juventude, ou que por ventura se derem conta que não têm condições materiais de dar-lhe o devido sustento, podem encontrar outras saídas. A primeira evidentemente é não engravidar. Caso tenha engravidado, pode abrir mão da tutela para parentes, se esses o desejarem, ou para instituições que se encarreguem de sua criação, ou adoção. Mesmo que se objete por alguma dessas saídas por não achar-las dignas de apreço, ainda assim acho melhor do que simplesmente ceifar a vida da criança.

Sobre a questão da saúde, seria bom termos em mente que o aborto é a sua negação, é a anti-saúde.

Quando chegamos a uma questão de governo, chega a ser pior. Para mim, basta a questão ética para me posicionar contrariamente à prática. Mas ainda assim por questão pragmática é fácil ser contrário. Dizem que, se uma vida for salva (claro, a vida da mãe; das crianças releva-se), já é melhor do que está aí. Mas os custos para a prevenção do aborto seriam mais bem empregados do que no caso do aborto. Vale dizer: o governo gastaria menos para mandar 365 camisinhas pelo correio para cada cidadão em situação “de risco” do que com o ônus desse novo serviço no sistema de saúde.

Mas ora, você diz: não é por que o sistema de saúde do governo não funciona que não devemos aumentar o direito à saúde da população. Mas a questão é anterior a essa. Primeiro porque aborto não é saúde, é sua negação, como já disse. Segundo porque o raciocínio é que não é porque não se consegue coibir o aborto que vamos legalizá-lo. Quando o ministro da saúde diz que essa é uma questão de saúde pública, aí é que eu me tremo mesmo. Duas crianças morrem por dia na Bahia por doenças provocadas pela falta de saneamento básico. Morrem de diarréia. Duas por dia somente na Bahia.

Evidentemente, mesmo que seja legalizado, como você mesma prevê, não seria o aborto uma panacéia. Nem você pensa assim, embora faça parecer que seja a solução mais simples.

Depois volto para completar, tenho que sair daqui. E vai mal escrito mesmo!

Ah!! Antes, algumas respostas à Zé. Primeiro, é muito simples dizer que a mulher é dona do seu corpo e pode fazer aquilo que bem entender. Não é por aí. Existe uma vida dentro dela e esta não é formada por puro capricho da mãe.

Com coisa ainda a dizer,

Márcio

10 comentários:

Manelé na Tela disse...

Se você já determinou que existe uma vida descobriu a resposta para o maior dilema. Também quero saber.

Amoêdo, a favor do direito de escolha da mulher mesmo que haja a tal vida.

Manelé na Tela disse...

Que há vida é inquestionável. Isso não é dilema. A questão é saber quando ela começa. Como nesta questão não há consenso, não arrisco, sou contra.

No entanto, salvo engano, após a formação de células sensitivas já se considera a vida do feto. A questão é daí pra trás. Não determinei nada, nem sequer é questão de fé.

Se o dilema para quando a vida começa é indissolúvel neste momento, escolho a vida, não o aborto.

Márcio

Manelé na Tela disse...

... o dilema sobre...

Márcio

Manelé na Tela disse...

Eu ainda estou lendo e ouvindo muito pra me posicionar sobre este tema.

- Alguns raciocínios:

1. A questão do aborto é sim uma questão de saúde. Abortar pode ser considerado oposto à vida, mas não uma anti-saúde. Se potenciais mães estão morrendo por causa de abortos ilegais, isso é um problema de saúde, sim. Se existem clínicas irregulares fazendo aborto isso é uma questão de saúde e de polícia. Se a resolução é a legalização do aborto, aí é outra coisa.

2. Se o feto pode causar a morte à mãe, acho que a médica ou o médico deve escolher a mãe, caso esta não prefira o contrário. Ninguém vai dizer: "por favor morra em nome do seu filho".

Não defendo que a vida seja privilégio de quem já nasceu. Mas ainda acho que a mãe é fato consumado, o feto é um "vir-a-ser". E neste caso, não dá pra apostar que: na dúvida, bola pra frente e vamos ver no que dá.

Mas esse caso já está previsto na atual legislação. É só pra responder a um comentário de Márcio.


2. Acho que o "problema" da gravidez indesejada não deve, à princípio, ser resolvida com o aborto. É óbvio que prefiro que as pessoas utilizem todos os métodos contraceptivos, inclusive com o investimento total do governo. Mas é diferente de: ah! foi transar sem camisinha, agora vai ter que assumir.

3. Quando começa a vida?

a) Fico me perguntando se uma criança sem cérebro é uma vida.

Aí um raciocínio, meio sofista, seria: nas fases de blástula, mórula e gástrula nos primeiros dias de gestação, não há vestígios de cérebro. Apenas na etapa da Nêurula o tubo neural é formado. Depois, na organogênese começa a formação dos órgãos.
(http://www.consulteme.com.br/biologia/embrio.htm)

Pergunto-me tb se a pílula do dia seguinte é aborto, se é tb "ceifar uma vida". É possível, eu acho, que no dia seguinte o espermatozóide já tenha fecundado óvulo.


4. Sobre a questão: haveria vida até a gástrula?

A justiça consideram que a vida começa no momento da concepção. O que é a concepção? É a fecundação, momento da criação do ovo ou zigoto.

Quem diz sim:

“O desenvolvimento do nascituro, em qualquer dos estágios - zigoto, mórula, blástula, pré-embrião, embrião e feto - representa apenas um continuum do mesmo ser que não se modificará depois do nascimento, mas apenas cumprirá as etapas posteriores de desenvolvimento, passando de criança a adolescente, e de adolescente a adulto”
Silmara J.A. Chinelato - Professora de Direito Civil e Direito Autoral da USP.

"Se os próprios gametas, por serem células muito mais complexas do que uma simples bactéria, já são elementos vivos, quanto mais o será o resultado da união de ambos, dotado de uma atividade e crescimento intensos!"
Jaime Espinoza no artigo "Questões de Bioética - 1 O embrião humano"
(http://www.quadrante.com.br/Pages/especiais020905.asp?id=152&categoria=Etica_Bioetica)

(Mas com esse raciocíno, a fertilização in vitro e o congelamento de embrião tb deveriam ser ilegais e não aceitos. Até uma brincadeira que fiz antes: nesse caso, os espermas e o óvulo tb são vida. Assim, quando a mulher ovula, ela tem que engravidar, pra não deixar morrer o óvulo? Os outros animais não perdem um período de cio sequer.)

Até onde pesquisei, a idéia que a vida começa com a fecundação tem mais força.

Ainda não sei se sou contra ou a favor a legalização do aborto. Mas sou favorável, por exemplo, à pílula do dia seguinte. Não vou ter um filho, pq a camisinha estorou, oras! Nem vou achar que processar a fábrica de camisinhas vai resolver o sustento financeiro. Mas aí, estou ceifando uma vida tb. O que fazer?

É isso mesmo, mais perguntas do que respostas.


Willow

Manelé na Tela disse...

"Mesmo que se objete por alguma dessas saídas por não achar-las dignas de apreço, ainda assim acho melhor do que simplesmente ceifar a vida da criança."

Nesse momento você já determinou que ali existe a "vida da criança" e este é sim o grande dilema: quando começa a vida? ou se pode ceifar o que ainda não começou?

Amoêdo, ainda curioso para saber que outros direito o feto teria. Devem ser muitos, né?

Manelé na Tela disse...

Willow,

"vir-a-ser" não é. Concordo com vc, por isso sou a favor do aborto.
A pílula do dia seguinte pode agir antes ou depois da fecundação, então é óbvio que vc não considera o aborto um assassinato, senão não assumiria o risco de matar alguém. Você não é um assassino.

Amoêdo

Manelé na Tela disse...

Vir-a-ser? Vir-a-ser o quê? Que "ser" é esse? Vale então dizer que se o feto estiver a um dia do parto ainda não é um "ser", e caberia no caso o aborto?

Podemos não ter certeza de quando começa a vida, mas a partir de determinado momento temos certeza que aquilo que está a nosso frente tem vida. Não sei quando a vida começa, mas sei que uma criança tem vida.

Assim, posso não saber quando começa a vida, se no momento da fecundação ou se na formação de células sensitivas ou em outro estágio qualquer, mas sei que o feto que dá um pontapé na barriga da mãe o faz por estar vivo.

Mas, a palavra "assassinato" é forte, não é? Apela-se a ela para apelar para a emoção dos que são contra o aborto. "Você então está chamando toda essa gente que faz aborto de assassina?". Mas, pode-se dizer, o nome modifica a essência da coisa?

Já declarei o meu posicionamento sobre o aborto no primeiro post, Willow e nós concordamos em algumas coisas. Mas posso te dizer que o feto é um "vir-a-ser" tanto quanto uma crinça, um adulto, e até um velho é um "vir-a-ser"... todos somos um "vir-a-ser" morto, por exemplo - só espero que esse "vir" seja determinado por algo natural ou por uma mera fatalidade, e não por determinação de terceiros.

Questão filosófica, não é? Existencialista. Somos eternos "vir-a-ser". Ninguém "é". Só "somos" essencialmente na morte. Ohhhhhh!

Márcio

Manelé na Tela disse...

Só mais uma coisa, Zé. Você está preso (ironicamente, óbvio) a uma questão de ordem meramente positiva quando fala dos direitos do feto, como quem questiona quais são os direito garantidos nas leis para os fetos. Não sei.

A questão que se discute, no entanto, é anterior a essa, e é algo elementar: é o direito à vida. Sem ela nunca haverá a possibilidade de qualquer outro direito. Se você nega esse, pra que você quer saber de algum outro?

Márcio

Manelé na Tela disse...

Usei o termo vir-a-ser para o feto em comparação à mãe. Acho que se a mãe corre risco, quem deve morrer é o feto. Acho que a mãe é realidade e o feto é uma quase-realidade.

Os médicos fazem escolhas semelhantes nas salas de emergência.

Se alguém perde o bebê no parto ou durante a gestação, essa pessoa não diz que perdeu o filho, como se perdesse uma criança de vários meses, um ano ou mais.
Ninguém diz: "uma vez eu tive um filho que morreu". Alguém dirá: "quantos anos ele tinha?". E a resposta: "nenhum dia, morreu no parto". Por mais que seja lamentável, é muito diferente de se perder um filho com o qual se teve contato e interação em corpos diferentes, se é que me entendem.

Entre a mãe, que interage, escolhe, está relacionada com outros, e o feto, que digamos já seja vida, mas não nasceu, só se conhece através de ultrassom, por mais que não mereça morrer e tal, qual a escolha mais óbvia? Acho que é a mãe.

Claro que existe o choque e tudo mais, mas é diferente.

Porém insisto. Este caso já está resolvido na atual legislação. E não vou queimar cartucho.

Digo que sou favorável à pílula do dia seguinte, por exemplo. Quanto a descriminação do aborto, ainda tenho dúvidas.

Willow

Manelé na Tela disse...

Eu defendo a vida das mulheres que não desejam um filho. Na dúvida, a vida que já está consumada.

Amoêdo, ainda sem enxergar a diferença entre a pílula do dia seguinte e o aborto.