Sob uma noite pouco alumiada

Agora que tomei ar, como diria um de vós, que me segurem. A volta de um sujeito perturbado pelo tédio não pode trazer boas coisas senão a inquietação. Os nervos se remexem num pandemônio de sensações que eu não controlo, e por vezes nem sequer tolero, são tiros contra os meus ossos cranianos e indefesos.

A noite de hoje não deu certo como é de costume. A minha particular dança da psique começa sob uma noite pouco alumiada, dentro de um quarto, só e sozinho, entre pensamentos os mais devassos e pesados. Até onde irei esta noite, eu não sei; pisco um olho pra a melancolia, fecho o outro para a incerteza do porvir.

O saudosismo vai à cama com uma sutil ponta de tristeza enlaçada ao redor dele, e por isso não dorme; sabe no fundo que o sono é o ensaio para a morte, e então namora a loucura, aquela eterna desgrenhada, de cabelo revolto e em desalinho, desventurada como sempre há de ser; gargalha, ri e chora; enfim, louca.

Hoje a hora combina com um morcego. Podia dizer também uma teia, mas a imagem estaria empobrecida, porém. Seria redundante dizer “mas porém” se não fosse a noite superlativa; não basta dizer “mas”, o “porém” sempre reforça: se isso é grave, para salvar a frase, digo gravíssimo; coisa desta noite em si.

Sob a escuridão dessa sexta-feira o que queria era ver as luzes da cidade, um asfalto molhado, ou a maresia que nubla o oceano. No lugar disso, no entanto, reza-me o sobejo desse cubículo quatro por quatro, metade silêncio, metade teclado: morre-se a voz e fica só o estalido, o de um mosquito e o de um suspiro.

Para Augusto dos Anjos...

Ava Adore!

Márcio