sexta-feira, dezembro 24, 2004

Diário de uma manhã tediosa de véspera de natal

Eis aqui de novo o relato de um natal. É fato público que eu detesto esta data, é lógico, é um dia fastidioso - e notório é ainda que tenho convicção disso. Fora a petulância, digo logo que ando em má companhia (e se má, bom pra mim) aprendendo a ter convicções. É lógico. Antes, no entanto, que a dona da lógica se ache com o jogo ganho, digo que se não sou irônico ou sarcástico, sou mentiroso. E isso serve para todos vocês que pensam em me xingar toda vez depois de me lerem.

Sei que hoje é apenas a porra da véspera, o dia de comer peru, ou chester (não galeto, viu, Alexandre?), mas esse dia é tão fudido que impregna o mundo com seu deslumbre dias antes. Hoje acordei cedo com o sol queimando os meus pés porque deixei a porra da cortina mais uma vez aberta. Bom começo!

Fui ligar a tevê e a primeira coisa que vejo na mtv é o clipe “Do They Know It’s Chrismans?”, não o da música original (dos Smiths, acho), mas um clipe tipo “We Are The World”. Puta que pariu! Natal sem fome, coisa linda, eu até me lembrei de uma piada de humor negro: Papai Noel foi pra Etiópia e chegando lá ouve de uma criança, “Papai Noel, eu quero uma bicicleta”, e o bom velhinho, “Nã, nã, nã, nã, não, menino que não come direito não ganha presente de natal...”. Bom filho da puta!

Bom, para garantir o divertimento do dia, fui ler um livro. Contos fantásticos, bem a calhar. Comecei pela história do Demoníaco Pacheco, um cara que se apaixona pela irmã da madrasta (que, diga-se, é apaixonada por ele), e acaba numa pousada assombrada, seduzido por ambas, mas depois de uma noite de fornicação funesta, ele desperta ao pé da forca dos irmãos De Zoto, deitado entre seus infames cadáveres, cercado de pedaços de cordas e restos de carcaças humanas! O bom do conto é que não se sabe se é sonho, alucinação ou realidade. Ha ha ha!

Para aliviar então meu espírito macabro, eu fui ouvir a minha nova aquisição musical. Quero dizer a Pedro Pimpão que agora eu também tenho o álbum branco dos Beatles. Cento e seis reais, e o disco 1 nem é tão bom assim, puta que pariu! Mas é assim que as coisas às vezes funcionam, por fetiche: acabei vindo a me render quando o vendedor me lembrou que se o disco já está esgotado na internet, quem dirá em lojas de Salvador. Já tava no ponto de ônibus de mãos vazias quando pensei melhor e acabei me rendendo, fraco que sou - e agora também mais pobre. Foda-se então.

Mas tenho que abrir um parêntesis para dizer que odeio vendedor de loja de discos. Filha da puta tirou onda comigo. Eu reclamei que o disco tava caro, aí ele me disse que era raridade, eu respondo que era raridade por escrotice de gravadora, tem a fita máster, tem procura, não reedita porque é esperta e filha da puta, aí ele me respondeu que não podia fazer nada, que ele tinha comprado o dele nos Eua, em Seatle!, por 60 dólares, e rematou: “eu tenho o meu, você não tem”.

Depois então dos Beatles, de Jimi Hendrix, e já no final do Queens Of The Stone Age, eis que uma ligação interrompe meu querido tédio. Estava eu lendo um texto sobre música, e acreditem, o cara falando de semiose ilimitada (que vida desprezível!), quando paro por causa de uma música muito boa. Pensei, “porra, que linha de baixo massa, de fuder”, tava claro que era aquela melodia que conduzia a música inteira. Então, estava me deliciando com aquilo quando a merda do telefone toca, e pensei, “se for uma das amigas colombianas da minha mãe falando espanhol vai ser foda”.

Não era. Tinha até vindo de longe a ligação, do interior de um estado que eu detesto. Porra, fiquei surpreso para caralho, repito, para caralho, não esperava. Era uma ligação de feliz natal, e uma lembrança de algo prometido, que eu prometi. Enfim, se não fosse ela, continuaria aqui escrevendo sobre dias tediosos de natal. Porém, mesmo não gostando de natal e também apesar de não ser as promessas não cumpridas o melhor pra ouvir, vindo como veio, de quem veio, me fez ganhar o dia e parar de escrever. Para o bem de vocês, que não leram até aqui, certamente...

É isso... por ora...

Márcio

Temporariamente desentediado

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