quarta-feira, outubro 18, 2006

O adeus de Jota

Meu amigo Jota é daqueles que a gente pode contar para tudo. Necessidade, lazer, desabafo. Nesses três anos de convivência, ele não se furtou a estar comigo em nenhum desses momentos. Exceto quando, por culpa minha, ficou fora de combate e não pôde estar ao meu lado. Só assim mesmo...

Jota foi um grande amigo. Companheiro de todas as horas, esteve comigo nos momentos mais importantes nesses últimos anos. Tanto os bons como os ruins. Jota foi meu parceiro nos regues, no trabalho, me ajudou a prestar socorros, a fazer favor a amigos e quebrou todos os galhos que podia.

Jota tava comigo na minha formatura, quando o Bahia foi rebaixado pra terceira, quando deixou de subir para a segunda, quando eu terminei meu último namoro, quando minha mãe precisou se operar, quando levei minha irmã pro vestibular, em dois carnavais, em inúmeras noites numa certa pracinha (as melhores)...

Jota viu muita coisa. Coisas boas, algumas censuráveis (também as melhores), e outras nem tão boas assim, como meu choro de tristeza, de desamparo, provocado pelos infortúnios do Bahia. Jota levantou minha auto-estima, me fez mais independente, mas, dele, dependente cada dia mais.

Jota se sacrificou por mim algumas vezes e não é exagero dizer que, numa delas, salvou minha vida. Independente dos maus tratos que tenha desferido contra ele, voluntária ou involuntariamente, Jota nunca se opôs a livrar minha pele. Mesmo que isso significasse feridas até hoje incuráveis nele.

Jota foi o amigo que, quando ausente, me fez falta como nenhum outro nesses últimos três anos. Esteve tão próximo e participou tão ativamente do meu cotidiano que também não temo exagerar quando digo que foi o terceiro relacionamento amoroso mais longo desses 25 anos. Só atrás dos namoros com Clara (7) e Tamy (3).

O Jota em questão não é uma pessoa – embora, para mim, mais importante que muitas delas (vocês não estão nesse bolo)-, e alguns já devem ter percebido. Jota é o apelido carinhoso que uma das várias caronas – certamente, uma das mais lindas e especiais – deu a meu carro. A origem é a placa dele- JNO – 6115. Para a referida pessoa, ele virou “Jota” ou “Jotinha”. Achei tão bonitinho vê-la falando que adotei o nome como referência para mim também.

Venho a falar dele porque nossa “parceiragem”, como diria um ex-chefe, chegou ao fim. Depois de três anos me servindo com extrema eficiência, robustez e durabilidade (principalmente), Jota saiu de cena na minha vida. Infelizmente, por conta dos princípios do sistema capitalista (que não estou negando, apenas constatando um de seus aspectos negativos), que, entre outras coisas, rege que automóveis com muito tempo de uso devem ser trocados sob pena de perderem gradativamente seu valor de revenda, e também, porque, coitado, Jota não tava agüentando mais o tranco.

Corria sério risco de desmontar, literalmente, no meio da rua. Culpa minha, que, ao longo desses anos, não dei a merecida manutenção a ele, já que mal tinha dinheiro para pagar as parcelas do financiamento, em virtude dos constantes atrasos salariais do meu ex-emprego. Jota pagou caro por isso. No último ano, andou se arrastando.

Amortecedor, para ele, há muito, era uma lenda. Os pneus tavam mais lisos que a cabeça de Picolé de Chuchu. O ar condicionado se foi na mais grave batida, em janeiro – quando Jota se fudeu todo, mas eu não tive nada. O vidro do motorista já tinha feito aniversário de um ano sem prestar. Panes elétricas e, consequentemente, apagões, eram freqüentes. Já tínhamos nos acostumado. Ainda assim, Jota resistia bravamente, apesar de ter jogado a toalha algumas vezes, mas, curiosamente, sempre escolhia situações que não me prejudicavam.

Jota só quebrou nos fins de semana em ocasiões que nunca atrapalharam minha atividade profissional. E sempre pifou perto de postos de gasolina, o que me proporcionava segurança para resolver seus pepinos, cada vez mais constantes. Nunca me deixou na mão no meio da rua. A média ultimamente era de uma vez por semana. Enfim, apesar da brava e heróica resistência, não dava mais.

Consertar ia custar muito e não valeria a pena, pela referida lógica capitalista, apesar da estima e apreço que nutro por ele. Portanto, visto que minha situação financeira deu um leve up-grade, troquei de carro.

Jota ficou ontem na concessionária. De grande amigo, virou moeda de troca e entrada num mais novo. A vida é cruel. O momento da separação foi difícil, mas me segurei. Desde guri que eu tenho essa mania de me apegar emocionalmente aos bens materiais. Com o principal e mais marcante deles, não haveria de ser de outra forma. Sou o que se poderia chamar de capitalista sentimental.

Mas, é isso aí. Bola, ou melhor, rodas para frente. Vida que segue, agora diferente, mais e, pela primeira vez em três anos, sem Jota.

Só queria mesmo compartilhar a gratidão ao meu ex-carrinho com vocês.

Valeu, Jotinha. Boa Sorte!

Apaixonado por carro, como todo o brasileiro,

Dadá JNO 6115

4 comentários:

Manelé na Tela disse...

qual é o carro novo?

Manelé na Tela disse...

Isso tudo praq dizer que tá mais rico?
W

Manelé na Tela disse...

O carro novo é do menos. O que importa é o valor sentimental do primeiro, seu insensível!

Saudoso,

Dadá

Manelé na Tela disse...

Eu te entendo Dadá, com azulão foi assim também.